Post originalmente publicado no Cultura em Processo.


Esse mês ainda, já de saco cheio, coloquei no meu Twitter e Facebook:

Enfim, naquelas semanas, não entendi bem o porquê, vi umas pessoas saindo do Facebook (entenda-se, excluindo a própria conta). Talvez algum reflexo retardado do caso daquele rapaz da Áustria, o Max Schrems, o que não deixa de ser irônico: afinal se esse tiver sido mesmo o estopim, excluir a própria conta só revela o quanto você não entendeu o ponto de Max Schrems.

Mas enfim. Papo era privacidade e, na mesma onda, veio a mudança da política de privacidade do Google, inundando todos os serviços da empresa com notificações a respeito disso. Ainda vale notar que o Google está com uma campanha por todos os metrôs de NYC (e talvez em outras cidades, mas não sei) defendendo sua mudança. E, em paralelo, vejo desde de então um monte de gente criticando essa mudança e dando dicas de como excluir seu histórico da sua conta no Google, entre outras coisinhas a mais para, digamos, “se defender”.

Meu ponto é simples, tão simples que o explicitei em um tuíte. Mas tem outro ponto que realmente me intriga. Para chegar nele, vou usar um tuíte, do Guga, um amigo meu:

O tuíte dele é mais “manchete escandalosa” do que o artigo que ele linka. Mas ambas colocam aqui dois caminhos para eu comentar. Um parágrafo pra cada caminho, vamos lá!

Eu, de pronto, respondi: Sobra [intimidade], e com folga. E prometi que escreveria mais sobre o assunto (o que é esse presente texto) Existe (e não é novidade, coisa de agora, de internet, de anos 2000 e pouco) muita intimidade sua armazenada, já há anos. Tantos anos, ou décadas, que até pararam de reclamar disso. Logo, o que eu falar tem um grau de novidade que é, de zero a dez, bosta — mas vamos lá: empresas de cartão de crédito. Elas sabem onde, quanto e quando você gasta. Os dados quantitativos (data, hora, valores e locais de compra), junto com análises qualitativas (como o que se faz num motel, ou o que se compra em uma floricultura) levam qualquer bom analista a inferir o que você anda fazendo tendo como base suas faturas de cartão de crédito. Pode-se até descobrir com quem você anda por aí — e olha que de repente aquela sua pulada de cerca com a secretária teria como esconder do Google e do Facebook, mas sacar o cartão na hora de pagar e pronto, está lá mais uma intimidade estendida no chão! Pode-se tomar séries cronológicas e identificar mudanças de comportamento, antever traições e divórcios, por exemplo — ou ainda inferir quais anúncios publicitários teriam em você um alvo apropriado.

O que importa é que nenhuma das empresas de cartão de crédito faz nada escancarado com seus dados, de modo que as pessoas (usuárias de cartão de crédito) não percebem isso como uma possibilidade de ameaça, não percebem nada que as incomode nisso — e, dado o avanço do sistema bancário, das compras por débito etc. o mesmo argumento vale para bancos como um todo. Essas instituições, agindo dessa maneira, passam segurança aos seus clientes, que se prendem aos benefícios de um cartão de crédito (parcelamento, segurança, crédito em si, por exemplo) e não se incomodam tanto quando, vez ou outra, recebem uma ligação de um telemarketing oferecendo curso de sei lá o quê, ou uma correspondência do banco sugerindo uma capitalização qualquer.

Como coloquei naquele meu tuíte, sei que o Google, o Facebook, o Twitter, o Foursquare, o Last.fm e mais uma penca de outros serviços tem um monte de informação íntima sobre mim. Mas, junto com meu Visa (operado pelo Itaú) e junto com o Banco do Brasil (sou correntista nele), permito que eles tenham essa informação, já que aproveito (e muito!) os benefícios de cada um deles. Se algum vier a me importunar,  cancelo e pronto. Se o cancelamento não for efetivo (ou seja, se mesmo após cancelar, os importunos persistirem), faço como o Max Schrems. Até lá, reafirmo: sei como eles ganham dinheiro e não me importo.

Assim, pergunto a vocês, grandes cavaleiros da defesa da privacidade online: o que lhes amedronta no Facebook? O que o Facebook lhes fez? E no Google? Me expliquem… ou ao menos sejam coerentes: se querem mesmo ser convincentes (comigo) com essa história de privacidade, nada de Google nem Yahoo (nem uma busca logado!), nada de webmail (GMail, Hotmail, Yahoo!Mail), nada de Twitter, nada de conta em banco, nada de cartão de crédito, nada de usar esses bilhetes únicos no transporte público! Volte ao dinheiro sob o colchão, tratos no fio-do-bigode e pagamentos só feitos na verdinha.

Ou, ao menos seja sincero: assumam suas incoerências.

Se forem comentar, lembrem-se que o título diz nhenhenhés, no plural: temos os seus nhenhenhés (que critiquei) e o meu grande nhenhenhé, esse texto inflamado aqui : ) Confronte-os — e escorracem o meu nhenhenhé — à vontade!